Sinto-me inquieta nestes tempos de ventania...Sinto-me desconfortável ante a minha inércia e inutilidade de meus pensamentos. Sinto o peito vazio e ao mesmo tempo inflado por outras aspirações, que não conheço, não provei, nem mesmo sei onde encontrá-las.
Estou blindada no meu apartamento, com os pés de chumbo presos em uma gaiola, mas meu coração voa, voa tão longe, quer mudar as coisas, quer mudar as pessoas... Ah! Essa minha inquietude...
Sinto-me tola e imprestável, contemplo minha vida e vejo que sou ainda jovem, que não devo esmorecer nem me entregar como as donzelas frágeis de outros séculos...Sinto que o tempo de contemplação é um pretérito, já terminou, não tenho “mais tempo prá me concentrar apenas comer pão com geléia” e me preocupar se amanhã vou comprar mais ou não.
Vejo que os dias se alongam e depois passam velozes, tudo isso distração da cápsula que criei durante minha viagem interior, fugi do externo e não pipoquei a frágil bolha que me circunda... Tenho medo.
Sinto o peito em brasa, a ardência não me deixa dormir, não me deixa respirar, sinto a ansiedade de fazer algo, de me saciar, de acabar com esse vento que sopra enquanto eu queria desgarrar uma das mãos e seguir com ele, deixar-me levar, abandonar essas coisas que não são tão minhas e essas ilusões que criei para me proteger.
Sinto-me como Jesus, que um dia em seus trinta anos levantou-se e não mais sentou. Mudou toda uma humanidade em três anos, sinto-me responsável pelo meu destino, e muito pior pelo destino de outrem, sinto-me convocada.
Quero buscar os problemas, mas eles estão aqui...O problema é que vivi fugindo deles e nunca me encarei verdadeiramente no espelho, venho tateando meu destino como um cego, como uma-mula sem- cabeça, como uma virgem pálida e débil, como uma mulher mesquinha e fútil, como um ser humano assustado com a beleza da vida, mas que não quer ter o trabalho de construí-la.
Sinto-me lúcida e isto realmente me assusta.