quarta-feira, março 22, 2006

Caminhando pelo sol ainda escaldante um moleque, mais ou menos com seus onze anos de idade me pergunta:
-Moça, vc tem problema na perna?
-Tenho...
-Por que não pega uma bengala?
-Melhor não responder...
Eu poderia ter mandado o guri para o diabo que o carregasse, mas minha expressão sarcática foi mais redundante do que qualquer julgamento.Ele esperava um palavrão, eu não devolvi...
A Pólio deixou uma seqüela em mim, mas não dessas que muitas pessoas se queixam e se acham diminuídas, frustradas e até mesmo encabuladas para tratar do assunto.Eu não podia fazer um esporte radical como surfe, como eu sempre quis, mas também foi falta de empenho( afinal existem pessoas com problemas maiores e que são verdadeiros heróis na superação de suas limitações), não pude fazer ballet, mas não deixo a desejar na pista de dança se rola um som legal( aliás eu sempre fui a Dancing Queen da música do ABBA)... A doença só evolui se você deixar que ela limite não o seu corpo, mas as expectativas que você tem dele.
Eu até já caçoei muito de mim( aliás eu mesma me dei o apelido de "Perninha" no escritório), na adoslecência é que foi meio brabo encarar que todas as meninas usavam shorts curots, saias minúsculas e eu não queria sair do par de calças...Até que uma amiga minha tirou esse complexo da minha cabeça e ainda me elogiou " dizendo que eu tinha as coxas mais bonitas que as dela".Desde então, eu sei que mesmo andando "esquisito', não tenho problemas com a seqüela, mesmo sabendo que um dia vou ter de operar, algo que ainda não fiz por pura opção...
A única seqüela que a Pólio me deu foi um calo na consciência.

domingo, março 19, 2006

Já ouvi "Trouble" do Coldplay repetidas vezes... Estou zumbizando até agora porque crise de insônia que não tem mesmo cura, quando se dá por fatores psicológicos.Não adianta tomar drogas para dormir.Na verdade, a música é uma forma de achar um consolo.
O no, I see,
A spider web is tangled up with me,
And I lost my head,
The thought of all the stupid things I've said,
O no, what's this?
A spider web, and I'm caught in the middle,
So I turned to run,
The thought of all the stupid things I've done,
I never meant to cause you trouble
And I never meant to do you wrong,
And I, well if I ever caused you trouble
O no, I never meant to do you harm
O no, I see
A spider web and it's me in the middle,
So I twist and turn
Here am I in my little bubble.
Singing out, I never meant to cause you trouble,
I never meant to do you wrong,
Ahhh, well if I ever caused you trouble
O no I never meant to do you harm
They spun a web for me
They spun a web for me
They spun a web for me

sábado, março 18, 2006

A solidão sempre foi uma constante em minha vida. As pessoas se iludem achando que solidão é “estar sem namorado, sem pessoas ao redor”. Enganam-se, pois, quantas vezes você já esteve cercado até mesmo pela sua família e sentiu-se só?Esteve com alguém que deveria preencher todas as suas expectativas de “companhia” e ao deparar-se com a pessoa do seu lado, você ainda sentiu-se frustrado por estar sentindo solidão?
Estar só, não é apenas opção, mas também várias vezes uma imposição de nossa natureza, um tom imperioso de nossas exigências, um reflexo do que somos e não nos vemos no parceiro, na família, nas pessoas.
Isto é solidão.
Eu a vivo desde pequenina quando alheia aos coleguinhas de classe, por vezes era preterida por não encontrar identificação, empatia, por não ter algo similar com alguém.
Óbvio que não era a menina sem popularidade, mas o pior de tudo é ser adorado, mas não encontrar em nenhum destes que te adoraram algo “em semelhante”.
Em raros momentos em minha vida (até agora né?) senti aquela sensação de “não estou mais sozinha” e daí, você sabe que isso faz um bem enorme, entretanto possui um revés que faz um mal danado. A solidão acaba quando você se vê em alguém, e esse mesmo se vê em você.

Lição número um

Não adianta dar festas, para encher a casa de gente: você vai gastar dinheiro, vai ser criticado e no fim vai terminar sozinho limpando a bagunça (na sua casa ou na sua cabeça...).

Lição número dois

Saiba cuidar bem de você porque quando estiver sozinho não queira se odiar.

Lição número três

“Solidão é pretensão de quem fica escondido fazendo fita”... Cazuza tava certo, por isso largue de ser também pretensioso.
Li num blog de um amigo meu o que ele comentava sobre a morte. Tenho até evitado falar sobre ela, já que nesse mês um colega querido faleceu.
Quando eu era criança eu tinha um verdadeiro pavor da morte, porque achava que não era justo morrer depois de experimentar tanta coisa boa, eu questionava Deus e apenas tinha sete anos quando comecei a ter um pesadelo que se repetiu até os quinze: eu sempre via o meu enterro, mas não via pessoas de minha família e para piorar tinha a sensação de estar sendo enterrada viva, ou seja: eu via tudo de lá de dentro do caixão... Pode parecer macabro, mas algo que para mim foi aterrador durante anos, hoje não mais me assusta.Eu tinha medo de morrer, não queria a sensação de ser lançada no “nada”( como se o nada fosse um lugar, veja só que piração), de não mais viver e apagar lentamente...Um dia minha mãe me ensinou a rezar para meu anjo guardião e durante algumas noites até que passou, porém os pesadelos seguiram com mais detalhes.
O que quero transmitir com estas palavras é simplesmente a sensação que eu tinha em relação à morte: de total desespero como se estivesse num “deadline” que não sabia nem qual era o término, com o agravante de que eu cresci dentro de uma educação Católica- a idéia de inferno, purgatório, etc.- pois eu sabia até para onde ia se morresse criança: para o limbo.
Entretanto, quando nos preocupamos com a morte e o quanto ela nos assusta, não percebemos que somos egoístas. Depois que parei de temer a minha morte ( afinal descobri a diferença entre não aceitar e não entender) comecei a reparar mais nos outros e no que se vive do hoje, o quanto a morte é devastadora para quem fica e até mesmo me preparo para que qualquer um dos meus queridos se vá.Também parece algo meio “ absurdo” mas é uma forma de você dar valor ao que você tem agora: sua família, seus amigos, sua namorada(o), até mesmo seu bicho de estimação, enfim a todo ser vivente que o cerca.Preocupamos-nos demais com o nosso envoltório, que ficará. O que há de ser feito com ele é como bem disse Marcel explicando a “reciclagem”, o que não se perde na natureza;virar comida de minhoca não parece uma idéia razoável, mas se você pensar que na verdade seu corpo é só um recipiente e que o importante é o líquido( alma), verá que depois de nos desprendermos dele, não somos mais aquele corpo.É comum um dente que cai, uma unha que se parte: um dia fez parte do conjunto; quando partimos não mais.
O que me preocupava na morte era justamente para onde iria tudo que consegui compilar nesta vida: meus sentimentos, visões, sensações, para onde iria meu “eu”, minha alma, minha essência e sempre achei que Deus jamais faria algo com tanto esmero para simplesmente destruir, condenar, fazer desaparecer.
Sou kardecista e antes disso, não me encontrei em nenhuma das religiões que cheguei a estudar, pois todas elas não me deram uma lógica para entender a morte e nenhuma delas colocou-me em uma situação tão próxima de entender os desígnios do Criador. Com isso, não digo que não aproveitem suas vidas aqui, não!Estou confirmando o que meu amigo disse: nosso corpo é aproveitado, assim como nossa alma (ele só se equivocou ao dizer que ficamos perambulando por aí, nem todos...). O que tememos é o fim, mas é natural do ser humano. Deus é Perfeito, e nos faria como a forma mais perfeita em nossa geometria, como o círculo que não tem fim e em vários círculos que se conectam temos o Universo.

A morte só existe para aqueles que acreditam na “cegueira da visão”, pois não podem visualizar um mundo além deste. Eu sei porque sou testemunha.



Geraldo, amigo, que o Mestre te envie a Divina Luz e o tenha em sua Infinita Misericórdia.

segunda-feira, março 13, 2006

Nicholas quedou-se inerte quando acordou mais cedo naquela manhã de segunda. Olhou da porta do seu quarto seu apartamento decorado em estilo moderno , um loft, algo que combinava com sua personalidade segundo uma amiga de colégio que se tornou arquiteta, ela mesmo fez o projeto.”È um espaço à sua altura, versátil, moderno, prático, típico para um homem solteiro, bem-sucedido e jovem”.
Ele olhou em volta e nunca tinha reparado que quase tudo no apartamento era escolha de outra pessoa e não dele... Achou tão impessoal quanto um quarto de hotel, olhou para a escultura que ficava em um dos cantos da casa e que todos os seus amigos invejavam por ser obra de um artista já falecido e uma das últimas confeccionadas, por vezes recebeu elogios por seu “bom gosto para com a arte” e impressionou alguns affairs de personalidade mais requintada.
- A noite com a ruiva valeu a pena... Só que, amigo, não gosto de você, se é que você me entende.Passo por aqui e sempre me incomodou essa sua cor de burro quando foge...Quer saber mesmo o que eu queria fazer quando você chegou nesta porra de apartamento? Te jogar pela janela... Com todo respeito ao seu autor mais ele tava totalmente desgostoso quando te fez e eu que tenho que pagar para ter você aqui me assombrando...
Lembrou de uma de suas ex-secretárias que agora estudava artes plásticas e pagava faculdade com a bolsa que lhe davam para ficar em escritórios como o dele. “Doutor, sinto muito, mas meu tempo acabou. Agora vou tentar um estágio remunerado em algo na minha área”, vibrava a jovem ao pedir seu afastamento. Quase um ano depois Nicholas ligou para ex-secretária.
- Mari?
-Pois não?É a Mariana...
-Sou eu, Nicholas.
- Doutor?É o senhor?Que milagre é esse?
-Olha, eu sei que fui um porre durante o teu estágio e critiquei sempre o seu jeito de se vestir, disse pra todo mundo que achava você a maior maconheira e péssima secretária, desaforada e libertina. Prá falar a verdade, eu que inventei aquela piada suja sobre a sua reputação e...
-Não acredito!Doutor, o senhor é mesmo um...
- Calma, eu sei que te persegui de todo o jeito. Mas, eu confesso que na verdade fiz isso porque eu me identificava com você...
-Quê?
-É, na verdade eu queria extirpar isso, queria cortar uma projeção do que eu era, ou do que eu deveria ser: doidivanas como você é...
-Doidivanas soa melhor, mas mesmo assim...
-É, eu sei, sou um burguês preconceituoso e falso moralista, quando na verdade eu queria mesmo era ir lá aonde você sempre ia...
-O quê, o senhor queria fazer o “dia verde”?
-Nem tanto, eu queria ir naquele boteco que você paga dez reais e toma cana de raiz, e ainda compra literatura de cordel...
-Ah, sei. Mas, o senhor não me ligou porque quer perdão ou entrou para alguma religião, meu Deus, o senhor está terminal?
-Sai pra lá, Mari... Eu te liguei pra te dizer toda a verdade e também porque eu tenho um grande problema.
-Lembra daquela escultura que você viu na foto e disse na minha cara que eu era um farsante por possuir algo do qual eu não sabia o valor?
-Sim, me lembro, ela foi roubada?Não acredito! Essa peça é a mais importante Rogério Cacá, um gênio, um...
- Olha Mari, eu já sei a missa de toda, por favor, eu sei até quantos amantes ele teve, eu não agüento mais saber nada desse cara... por isso, você pode vir pegar a peça aqui amanhã?
-O quê?
-Vai dar a peça para mim?Eu tenho que te “dar” algo?
-Não, precisa “dar”. É sua, pode vir buscar, quanto mais cedo melhor.
-Não, isso só pode ser trote... O senhor me liga numa segunda para dizer que eu sou pessoa legal, que deveria ser como eu, confessa toda a sacanagem que fez comigo e ainda quer me dar uma peça cara de inestimável valor artístico, não acho que andei fazendo muito a cabeça esses dias...
-Eu tenho que desligar, vou deixar um recado D. Alice que cuida das minhas coisas aqui e ela deixa você entrar e levar a escultura, qualquer coisa ela me liga no celular.
- Não tenho palavras...
-Hipocrisia agora não, né, Mari?Pôxa, isso não é nada a sua cara...
-Tá certo, eu queria mandar o senhor se foder faz muito... Esse seria meu maior prazer, dizer isso pessoalmente ,e já que senhor quer uma opinião minha mesmo, nada do que o senhor fez vale isso que está me dando, mas já um começo.Se a próxima “ quinquilharia” que o senhor ganhar não gostar aceitamos doações.E, outra o senhor se acha muito sexy, mas nunca olhou para direito para o seu sorriso de hiena bêbada...
- Pensei que tinha uma queda por mim, principalmente quando eu sorria... Valeu, Mari.
- Eu? Não mesmo. A única coisa que sempre me atraiu no senhor foi o dinheiro.Obrigada por ajudar a brigada dos pobres estudantes de arte... Foda–se!

A morena que usava óculos esquisitos e roupas nada tradicionais desligara na sua cara.

Nicholas explodiu em gargalhadas. Foi no espelho conferir o sorriso de hiena bêbada. O que ele queria expressar era um cinismo, o famoso sorriso provocante que toda mulher não resiste.
“Bem devo lhe dar algum crédito, afinal é uma artista, vê outras perspectivas... Não é mesmo que pareço estar meio bêbado?Mas não vejo nenhuma hiena...”Sentiu-se um completo idiota por sorrir para todas as belas que passaram por sua vida daquela forma, e começou a testar várias outras expressões.

-Meu dinheiro é mais sexy do que eu...

Subitamente, todos os alarmes dispararam seu palmtop, celular, relógio de cabeceira. Eram programados para ficarem soando por exatos cinco minutos e dessa vez ele deixou que a confusão de sons perdurasse. “Isso é para você não mais ativar neuroticamente quatro alarmes”. O quarto seria justamente o último que seguiria logo após os cinco minutos. Uma coletânea músicas clássicas que sempre o embalavam para um começo de dia triunfante. Enquanto ele escolhia o terno, tomava banho, conferia seus compromissos matinais. Só que naquele dia ele correu apenas para esse último alarme e ligou o rádio. A primeira música era um funk totalmente explícito em sua exposição sexual. Ele riu, gargalhou mais uma vez e até dançou na frente do espelho.Uma palavra ativou sua libido e foi para o box do banheiro.Estava a se masturbar... "What a wonderful world” com Louis Armstrong ecoava pela casa enquanto ele via fachos de luz adentrando o apartamento, respirava pausadamente depois do êxtase e então tomou uma ducha demorada, viajando com a música.

Não gosto de rótulos
eu quero identificação
não quero RG, CPF, passaporte
não quero nada disso, não!
Mesmo que eu não seja
eu quero explicação
mesmo que eu não tenha
eu quero saber o " porquê" desse não
Mesmo que saiba
não quero guardar em vão
mesmo indigente
descrente
sou ser vivente mereço atenção.
Mesmo sem dentes
preciso de identificação.