Depois de muita chuva, o sol esquenta o domingo. A vizinha apressa as crianças, dia de praia. Estou só em casa e o jornal de domingo chega. Leio as crônicas de Gilson Nascimento e Mayrantt Gallo, passo para os classificados e descubro que até a Raica, já tem cotação no mercado de “profissionais voluntariosas” que fazem companhia para executivos do tipo VIP, ou na tradução mais rude e popular, puta.É cedo ainda, começa a chover e alguns tiram o cavalinho da chuva, ou melhor, nem mesmo tem dinheiro para comprar um, tiram a tralha da sacola, esquecem da farofa tão dominical e desistem de comprar frango. Nada de praia. Meu telefone toca “Satisfaction” e nem consigo atender, pois uma dor uterina, mais conhecida como cólica me faz contorcer -e não há nada de satisfação nisso - e, falo com minha melhor amiga que me pergunta se vou ou não ajudá-la a ir à Delegacia. Acontece que, uma mulherzinha - e quando digo “zinha” é da pior espécie - pegou um táxi de uma cidade para outra, quase 100 Km e foi insultar minha amiga só porque ela estava namorando o “ex” dela...Que me chamem de fria e calculista, mas eu jamais protagonizaria uma cena assim.Moi?!Mamãe que não teve a mais britânica ou francesa das educações, mesmo assim me ensinou que é melhor ser um iceberg do que afundar com navio e tudo mais; infelizmente, algumas pessoas só entendem a linguagem do “vá tomar” e adoram que você se iguale: não são todas que merecem essa sua depreciação verbal.A coisa foi feia: agressão física.Não culpo minha amiga porque sua natureza é calma, entretanto tem sangue espanhol nas veias, que somado ao baiano, só poderia dar em cena de folhetim das oito. Senhoras e senhores, são páginas da vida(argh).Levantei da cama, me entupi de analgésicos e empurrei literalmente algo comestível.
O que mais me chamou atenção foi que enquanto esperava ela chegar na livraria da rodoviária, um senhor começou a conversar com um jovem.
O rapazote meio tímido folheava um desses livrinhos com “leõezinhos na capa”, bem bobinhos, com frases bem feitinhas, tudo detestavelmente açucarado.Vejamos o diálogo, que eu captava com toda atenção de bisbilhoteira:
-Você gosta de ler meu rapaz?
-Sim, muito...
-O quê?
-Ah...Romances...Essas coisas (amareladamente, devolve o livro à prateleira e me olha desconcertado).
-Você deve também se aprofundar e descobrir mais coisas ao seu respeito...Sabia disso?
Então, o sábio senhor que afirmava possuir 3.000 mil anos (é isso mesmo...) de pesquisa, dava conselhos cósmicos e o rapaz ouvia atentamente, às vezes puxava o velho senhor para lhe dizer algo, pois o mesmo era surdo de um dos ouvidos. O ancião percebeu que eu ouvia e passou a palestrar virando-se para mim e para o rapaz.Sabiamente, ele citou vários cientistas, traçava paralelos entre eles, coisas profundas sobre o espírito humano, as coisas mais verdadeiras que ouvi durante toda a semana inteira, enquanto eu tentava esconder um infame e genial exemplar que carregava comigo de Hilda Hist e outro de João Ubaldo.Seu nome era Ubirajara e ele me deu um cartão de um espaço de meditação, que não sei como descobriu que eu gostava, ou sentiu...Senti no ar um aroma de rosas que circundavam o ambiente.Ele me disse:
-Não queira ser médium, seja só você mesma.Se for uma escolhida, trabalhe essa energia, mas não faça disso um drama...Sim, por mais que eu lhe diga o que é bom para comer, quem vai ter que comer é você. Por isso, alimente-se, mas de forma correta.Cuide dos chakras.
Eu levava meio que na descontração, mas quando ele falou isso tentei não desfazer, aceitei.
Fechei com a clássica de que conhecendo a nós mesmos, conhecemos o universo e ele disse que eu tinha pegado a mensagem. O rapaz se despediu porque ia ver a namorada, eu também porque minha amiga me procurava.O velho Ubirajara despediu-se foi até a Siciliano procurar mais conhecimento...Minha amiga ainda choque, não conseguia comer, eu tudo que via me revirava o estômago.Almoçamos mesmo assim.Na Delegacia a má vontade é sempre uma constante, principalmente num Domingo de sol: os agentes blasfemam, os policiais doidos para tomar uma breja, ver a morena de biquíni e tendo que ficar enfiados nas fardas cor –de-burro-quando-foge da polícia local, vendo todo tipo de “Zé ruela” adentrar no recinto.
Entregamos a intimação, missão cumprida.
Eu pegava o ônibus em direção a minha casa deixando a amiga com o tão disputado namorado. “Humm... Sempre só...”, eu voltava igual ao Cazuza, meio que com inveja, meio que com melancolia.
Dentro do ônibus meu estômago começou a se revoltar...E quando desci mais parecia uma usuária de heroína, vomitando tudo que forçado para me manter de pé.Sensação horrível, nunca mais tinha tido náuseas, nem me lembrava mais o que era ter náuseas...Vi tudo rodopiar, a temperatura cair, pensei em ligar para meus pais, mas eu mataria um deles, certamente.
Andei um pouco, entrei numa farmácia, comprei o que o cara falou, péssima mania de brasileiro...Do lado, um cybercafe, viciados em CS por todo canto.
Pensei na minha mortalidade, na minha fragilidade, lembrei do conselho.
Então pensei “nele”, por que não?
E ele me chamou de amor depois de uma longa temporada.
O sol realmente reapareceu num dia certo.
O que mais me chamou atenção foi que enquanto esperava ela chegar na livraria da rodoviária, um senhor começou a conversar com um jovem.
O rapazote meio tímido folheava um desses livrinhos com “leõezinhos na capa”, bem bobinhos, com frases bem feitinhas, tudo detestavelmente açucarado.Vejamos o diálogo, que eu captava com toda atenção de bisbilhoteira:
-Você gosta de ler meu rapaz?
-Sim, muito...
-O quê?
-Ah...Romances...Essas coisas (amareladamente, devolve o livro à prateleira e me olha desconcertado).
-Você deve também se aprofundar e descobrir mais coisas ao seu respeito...Sabia disso?
Então, o sábio senhor que afirmava possuir 3.000 mil anos (é isso mesmo...) de pesquisa, dava conselhos cósmicos e o rapaz ouvia atentamente, às vezes puxava o velho senhor para lhe dizer algo, pois o mesmo era surdo de um dos ouvidos. O ancião percebeu que eu ouvia e passou a palestrar virando-se para mim e para o rapaz.Sabiamente, ele citou vários cientistas, traçava paralelos entre eles, coisas profundas sobre o espírito humano, as coisas mais verdadeiras que ouvi durante toda a semana inteira, enquanto eu tentava esconder um infame e genial exemplar que carregava comigo de Hilda Hist e outro de João Ubaldo.Seu nome era Ubirajara e ele me deu um cartão de um espaço de meditação, que não sei como descobriu que eu gostava, ou sentiu...Senti no ar um aroma de rosas que circundavam o ambiente.Ele me disse:
-Não queira ser médium, seja só você mesma.Se for uma escolhida, trabalhe essa energia, mas não faça disso um drama...Sim, por mais que eu lhe diga o que é bom para comer, quem vai ter que comer é você. Por isso, alimente-se, mas de forma correta.Cuide dos chakras.
Eu levava meio que na descontração, mas quando ele falou isso tentei não desfazer, aceitei.
Fechei com a clássica de que conhecendo a nós mesmos, conhecemos o universo e ele disse que eu tinha pegado a mensagem. O rapaz se despediu porque ia ver a namorada, eu também porque minha amiga me procurava.O velho Ubirajara despediu-se foi até a Siciliano procurar mais conhecimento...Minha amiga ainda choque, não conseguia comer, eu tudo que via me revirava o estômago.Almoçamos mesmo assim.Na Delegacia a má vontade é sempre uma constante, principalmente num Domingo de sol: os agentes blasfemam, os policiais doidos para tomar uma breja, ver a morena de biquíni e tendo que ficar enfiados nas fardas cor –de-burro-quando-foge da polícia local, vendo todo tipo de “Zé ruela” adentrar no recinto.
Entregamos a intimação, missão cumprida.
Eu pegava o ônibus em direção a minha casa deixando a amiga com o tão disputado namorado. “Humm... Sempre só...”, eu voltava igual ao Cazuza, meio que com inveja, meio que com melancolia.
Dentro do ônibus meu estômago começou a se revoltar...E quando desci mais parecia uma usuária de heroína, vomitando tudo que forçado para me manter de pé.Sensação horrível, nunca mais tinha tido náuseas, nem me lembrava mais o que era ter náuseas...Vi tudo rodopiar, a temperatura cair, pensei em ligar para meus pais, mas eu mataria um deles, certamente.
Andei um pouco, entrei numa farmácia, comprei o que o cara falou, péssima mania de brasileiro...Do lado, um cybercafe, viciados em CS por todo canto.
Pensei na minha mortalidade, na minha fragilidade, lembrei do conselho.
Então pensei “nele”, por que não?
E ele me chamou de amor depois de uma longa temporada.
O sol realmente reapareceu num dia certo.
7 comentários:
Você escreve super bem, Larissa!!!
Adorei esse post!!!
:)
Vou mandar pelo seu email
o codigo para que vc possa colocar
música. Ok??
Beijosssssss
Larissa,
é de tirar o fôlego.
no melhor sentido.
Sensacional.
Teus periódos longos e cheios de ritmo.
A maneira que você inventa de guiar a narrativa como se a narrativa fosse uma bicicleta ou uma carroça ou uma ferrari ou um cavalo em disparada sem freios pela ladeira àbaixo...
E como você controla tudo na chegada.
Muito gratificante a leitura do teu texto.
Pasmo privilégio meu poder fazer dele minha leitura.
Obrigado.
reli tudo de novo. Como você escreve, hein?
queria extrair uma imagem, um detalhe, mas o efeito integral da leitura do teu texto é tão avassalador que não dá márgem pra esse tipo de operação subtrativa.
ai que chique meu nominho na sua coluna!!!! Fiquei toda prosa!!!
:))))
Beijosssssssss
O Ballantyne recomendou a leitura de teu blog no Notas Avulsas.
Vim curioso e saio gratificado.
Gostei Larissa...Voce nao e outra criacao do CJB nao, ne? Pergunte a ele o porque da minha pergunta e ele te explicara tudo!! beijo
Larissa, explico sim. Em separata. Para proteger a identidade dos inocentes...
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